O Hamas se tornou a mais nova parte nas negociações de reféns e cessar-fogo em Gaza a expressar otimismo sobre as perspectivas de chegar a um acordo, em meio a uma onda de atividade diplomática na região.
Em uma declaração oficial na terça-feira (17), o grupo afirmou que chegar a um acordo era “possível”. Uma fonte do Hamas também acrescentou que as negociações foram “positivas e otimistas”.
As principais autoridades dos Estados Unidos, Israel, Catar e Egito têm elogiado o progresso nas negociações nos últimos dias. Embora autoridades alertem que um acordo não é selado nem garantido, a linguagem otimista e a atividade diplomática recente apontam para um impulso significativo em direção a uma resolução.
O diretor da CIA, Bill Burns, deve viajar para o Catar ainda nesta semana para participar de mais negociações sobre um cessar-fogo na Faixa de Gaza, afirmaram à CNN um oficial dos EUA e uma segunda fonte familiarizada com os planos, com Burns esperado em Doha já nesta quarta-feira (18), conforme a segunda fonte.
Uma fonte israelense próxima à discussão contou à CNN que um acordo ainda estava potencialmente a semanas de distância.
O Hamas também alertou que os obstáculos permanecem, sugerindo que Israel estava “impondo novas condições” nas negociações.
“O Movimento de Resistência Islâmica Hamas afirma que, à luz das discussões sérias e positivas que estão ocorrendo em Doha hoje, sob os auspícios de nossos irmãos do Catar e do Egito, chegar a um acordo para um cessar-fogo e troca de prisioneiros é possível se a ocupação parar de impor novas condições”, declarou a organização em um comunicado.
As equipes israelense e do Hamas estão na capital do Catar para negociações indiretas. A delegação de Israel inclui representantes dos serviços de segurança do Mossad e do Shin Bet, contou uma fonte familiarizada com o assunto à CNN.
É o período mais intensivo desde que as negociações fracassaram no final de agosto.
Os termos do trato são basicamente os mesmos da proposta apresentada pelo presidente dos EUA, Joe Biden, no início deste ano, de acordo com uma fonte diplomática próxima ao assunto.
A proposta de Biden em três fases no final de maio combinou a libertação de reféns mantidos em Gaza com um “cessar-fogo total e completo”.
A primeira fase duraria seis semanas e incluiria a “retirada das forças israelenses de todas as áreas povoadas da Faixa de Gaza” e a “libertação de vários reféns, incluindo mulheres, idosos e feridos em troca da libertação de centenas de prisioneiros palestinos”, pontuou o líder americano.
“O que mudou é que as forças de Israel provavelmente permanecerão no território temporariamente”, quando a primeira fase do acordo começar, apontou a fonte diplomática, ou seja, na faixa de terra na fronteira entre Gaza e Egito, chamada de corredor Filadélfia, e em uma área que divide a faixa, conhecida como corredor Netzarim.
Tentativas de negociação
A exigência de Israel de que suas tropas permaneçam ao longo do corredor de Filadélfia — e a insistência do Hamas de que elas se retirem — foi uma razão fundamental para o colapso das negociações em agosto.
Uma autoridade dos EUA relatou à CNN que as reuniões de Doha estavam no nível “de trabalho” mais baixo. “Oficiais americanos acreditam que um acordo está mais próximo do que nunca, mas alertam que há lacunas e pontos de atrito que permanecem entre as duas partes”.
A linguagem otimista segue uma série de atividades diplomáticas regionais, incluindo uma visita do Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, a Israel, Egito e Catar na semana passada.
“Meu objetivo será nos colocar em uma posição para fechar esse acordo neste mês”, expressou Sullivan na semana passada, falando após sua reunião com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.
Brett McGurk, um dos principais conselheiros sobre Oriente Médio do presidente Biden, permaneceu em Doha com outras autoridades americanas trabalhando em direção a um cessar-fogo em Gaza, pois os oficiais dos EUA acreditam que uma resolução está mais próxima do que nunca.
McGurk estava viajando na região com Sullivan e o fato de ter ficado é um sinal de que a administração sente um momento positivo, mas uma resolução não é esperada em breve.
Influências sobre as negociações
Autoridades dos EUA e de Israel disseram que as condições amadureceram para que um acordo fosse alcançado após o cessar-fogo entre Israel e o Hezbollah, que isolou ainda mais o Hamas em sua batalha contra Israel.
Os oficiais também apontam para o assassinato do líder do Hamas, Yahya Sinwar, e outras conquistas militares israelenses como dando ao governo israelense as vitórias que ele buscou alcançar antes de chegar a um cessar-fogo.
Desde o ataque de 7 de outubro de 2023 a Israel, o número de mortos pela ação militar israelense em Gaza aumentou para mais de 45 mil, com cerca de 106 mil pessoas feridas, segundo o ministério da saúde no território.
O presidente eleito dos EUA, Donald Trump, também impactou as negociações, empurrando Netanyahu em direção a um acordo e ameaçando que haveria “um inferno a pagar” se os reféns não fossem libertos até que ele assumisse o cargo.
Sua equipe de entrada também coordenou de perto com o governo Biden e fez viagens à região para ajudar a garantir um acordo.
O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Matthew Miller, disse na terça-feira (17), que há um “otimismo cauteloso temperado pelo realismo” sobre a possibilidade de finalmente alcançar uma trégua em Gaza.
“Com base nas questões restantes, devemos ser capazes de chegar a um acordo e de superar as divergências entre as duas partes”, exclamou Miller, sem entrar em detalhes sobre as questões restantes.
“Mas isso não quer dizer que necessariamente irá acontecer, houve momentos antes em que estávamos próximos e achamos que as diferenças eram superáveis, e, no final das contas, não conseguimos um acordo”, relembrou durante uma coletiva de imprensa na terça-feira.
Segundo Miller tudo o que os Estados Unidos podem fazer é “pressionar e tentar chegar a compromissos, mas não podemos ditar a nenhum dos lados qual escolha devem ser feitas. Eles têm que tomar essas decisões por si”.
Pequenos passos para um cessa-fogo
O negociador israelense de reféns de longa data Gershon Baskin alertou que “não há acordo até que haja um acordo”.
“O Hamas está pronto desde setembro para um acordo abrangente para acabar com a guerra, devolver todos os reféns em troca de prisioneiros palestinos e até concordou em abdicar do controle em Gaza“, falou Baskin, que não está diretamente envolvido nas negociações, mas continua sendo um analista afiado. “O que está se formando agora, talvez, seja um grande esforço egípcio-catariano para chegar a um acordo em etapas”.
Para o negociador “a raiva pública contra o Hamas está explodindo por toda Gaza”.
“Ao mesmo tempo, o grupo não concordará em libertar todos os reféns se as IDF permanecerem no território, e mesmo que haja um cessar-fogo temporário, ele não durará se Israel pretende impedir a livre movimentação de um milhão de moradores da Faixa de Gaza que querem retornar para suas casas que não existem mais”, continuou.
O primeiro-ministro israelense também prometeu que não encerrará a guerra até que o Hamas seja completamente derrotado em Gaza, aumentando a perspectiva de a guerra recomeçar assim que vários reféns forem libertos na primeira fase do acordo.
Destruição em meio ao otimismo
O otimismo renovado sobre as negociações vem mesmo com as forças israelenses continuando a atacar o norte de Gaza em uma ofensiva que Israel diz estar mirando a presença renovada do Hamas na área.
Ataques israelenses mataram pelo menos uma dúzia de pessoas em Gaza durante a noite, relataram autoridades de saúde no território nesta quarta-feira (18).
Dez pessoas foram mortas e várias outras ficaram feridas em ataques israelenses a uma casa perto do hospital Kamal Adwan no norte de Gaza, segundo o Ministério da Saúde de Gaza. A área foi atingida repetidamente na semana passada.
As Forças de Defesa de Israel (IDF na sigla em inglês) declararam que um ataque ao local na terça-feira (17) teve como alvo militantes do Hamas que planejavam contra as forças israelenses.
Islam Ahmad, uma testemunha ocular que estava dentro do hospital na época, informou à CNN que o ataque atingiu um prédio residencial que abrigava famílias deslocadas.
A destruição ao redor de Kamal Adwan restringiu o fluxo de suprimentos médicos para o que é um dos três hospitais ainda operacionais no norte de Gaza.
O hospital foi “bombardeado implacavelmente” nos últimos dias, conforme o diretor da unidade, Dr. Hussam Abu Safiya. Ataques a seus geradores o deixaram sem eletricidade, o tanque de água foi destruído e a equipe da unidade de terapia intensiva – a última em funcionamento na área, segundo ele – foi baleada.
“Qualquer um que se mova no hospital arrisca ser ferido ou morto. No momento, não há eletricidade, água ou oxigênio”, ele contou na terça-feira, acrescentando que “está claro que o mundo inteiro não vê ou não quer ver o que está acontecendo.”
Dos três hospitais minimamente operacionais restantes no norte de Gaza, Kamal Adwan é o mais próximo da atividade militar israelense em Beit Lahiya e no Campo de Refugiados de Jabalya e tem recebido a maioria dos feridos dos combates ao redor.
Na segunda-feira (16), o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, explicou que a equipe da OMS finalmente havia chegado ao hospital dois dias antes, depois que quatro missões anteriores tiveram o acesso negado, deixando o hospital sem pessoal especializado para cuidados cirúrgicos e maternos.
O chefe da OMS informou que as hostilidades em andamento ao redor do hospital “danificaram ainda mais o suprimento de oxigênio, geradores e quebraram janelas e portas dos quartos dos pacientes”.
“As condições no hospital são simplesmente terríveis”, alertou ele.